terça-feira, 3 de junho de 2008

É verdade.

O amor morreu

Amar não é verbo intransitivo

Sim, verbo inexistente


O amor era um monte de coisas

E nada ao mesmo tempo

Era tantos sentimentos

Até os piores possíveis

Era aquela ardência louca

Era o inefalável


Morreu, cruzou a velha esquina e caiu

Quem o matou, não sei


Talvez um poeta

Talvez um louco

Talvez um amante

Talvez todo mundo

Talvez ninguém

É verdade

É verdade.

O amor morreu

Amar não é verbo intransitivo

Sim, verbo inexistente


O amor era um monte de coisas

E nada ao mesmo tempo

Era tantos sentimentos

Até os piores possíveis

Era aquela ardência louca

Era o inefalável

Morreu, cruzou a velha esquina e caiu

Quem o matou, não sei

Talvez um poeta

Talvez um louco

Talvez um amante

Talvez todo mundo

Talvez ninguém



sábado, 17 de maio de 2008

Cuidado

A verdade como elemento perdido na escuridão
O vazio austero
A podridão se mostra de modo concreto
Dentro da concretude das latrinas
que jorram alardeantemente
A silenciosidade corta
A passidade já silenciada
O que era zero torna-se menos
O grito agora é refluxo
Cuidado!

Tantas mentes defloradas
Perdidas em suas entorpecentes verdades
Cuidado!

Não siga o velho fluxo.

domingo, 23 de março de 2008

Bróder! Capão Redondo chega às telonas

Por Adriane Piscitelli e Marcos Bonfim


Jeferson De, diretor e roteirista de cinco premiados curtas que discorrem sobre a condição do negro na sociedade, estréia Bróder!, seu primeiro longa-metragem com a atuação de Caio Blat, Cássia Kiss e Aílton Graça. O filme tem como cenário o bairro do Capão Redondo, periferia da zona sul de São Paulo. Em 2000, o cineasta lançou o manifesto Dogma Feijoada – Gênese do cinema negro brasileiro, o qual possui sete preceitos básicos para a produção de um filme, entre eles, que o protagonista deve ser negro. Em entrevista ao Contraponto, Jornal Labotário da PUC-SP, ele apontou sua visão sobre como o negro é abordado pela mídia. A entrevista sairá na edição 51.


Contraponto Como foi sua primeira produção e direção de um longa-metragem? E quanto às dificuldades encontradas?

Jeferson De – São vários temores. No curta são cinco dias filmando e já está pronto, há um controle sobre tudo. No longa-metragem são muitas responsabilidades envolvidas, desde o roteiro até o volume de dinheiro. Discuti o roteiro com muita gente e isso foi gratificante. O Hector Babenco e o Cacá Diegues me ajudaram muito. O Babenco me falou um dia: “Jeferson você tem um roteiro maravilhoso na mão, mas te peço: não se esconda atrás da sua cor, você é muito mais inteligente do que o seu roteiro pressupõe que seja”. Isso foi muito importante. Confesso que fiz um filme muito melhor do que gostaria de fazer. Chamo esse filme de B.O. de luxo, porque é um filme de baixo orçamento, cerca de 3 milhões, mas com um elenco absurdo. Quanto aos contras, tive medo de copiar o Spike Lee, o Babenco, o Woody Allen, mas vejo o filme pronto e sinto uma profunda originalidade naquilo que estou fazendo.


CPO que o seu filme se diferencia de todos os outros sob mesma temática da periferia? Qual é a abordagem nova?

JD – Tem um modelo que já se esgotou há muito tempo, basicamente com Cidade de Deus, aquela coisa de mostrar negro dando tiro em negro na periferia dos grandes centros. Até porque o Cidade de Deus aponta para vários caminhos e um deles chamou minha atenção. Senti vontade, como negro e urbano, de conhecer a família do Zé Pequeno. Queria conhecer a mãe dele, o pai e os irmãos. O Bróder! leva, de fato, as pessoas à periferia, enquanto a mídia aborda de maneira distorcida o Capão Redondo, a Rocinha ou qualquer lugar da Bahia, sempre focada na questão da violência. O meu filme se diferencia por ter uma história simples, humana, baseada na amizade entre três caras. É a história de um menino chamado Macu, o Caio Blat, tem também o Jaiminho, que é o Jonathan Haagensen e o Pibe, que é o Sílvio Guindane. Essa história resume três caminhos que qualquer jovem da periferia ou não tem de seguir. O primeiro é o da bandidagem, do político corrupto, do traficante, esse caminho é marcado pelo Macu. O segundo é o milagre, alguém que tem um talento e não tem controle sobre aquilo. É diferente de estudar, prestar vestibular, que já é o terceiro caminho. É o meu Alter Ego, o Pibe. Ele está na batalha, recebendo vários “nãos” no caminho, mas não tem a mínima graça, não tem glamour nenhum defender uma tese de doutorado, mas jogar no Real Madrid sim, muito. Ser um traficante ou roubar um banco também tem glamour, mas é a vida curta. E o filme tem esses três caminhos explícitos, batendo o olho já sabemos quem é o milagre e quem é o bandido. Tudo isso forma o microcosmo da sociedade brasileira. Eu pensei “quero fazer um filme que minha mãe entenda”, sendo que ela estudou até a sexta série. Eu contei a história do Bróder! e ela entendeu.


CPA escolha desses três nomes – Macu, Jaiminho, Pibe – não foi aleatória. Pensamos que talvez o Pibe fosse uma referência ao nosso Produto Interno Bruto (PIB), que busca melhor condição de vida longe da periferia.

JD–É o Produto Interno Bruto. Ele quer crescer e não cresce, nada acontece na vida dele. Ele mora na beira do minhocão, entra em casa e está com a luz cortada. Nós somos um país de gente jovem que não sai do lugar, com o desejo de crescer sempre. O Jaiminho, obviamente, é uma citação a todos os “inhos”, o Ronaldinho, Robinho. O Macu é uma referência explícita ao Macunaíma de Mário de Andrade, que é um livro impressionante.


CP O Mário de Andrade descreveu o Macunaíma como sendo o nosso herói sem caráter. O seu Macu também caminharia sob o mesmo viés?

JD – Não é que o Macunaíma não tenha caráter, ele tem vários. Ele é um índio, que virou negro, que virou branco e que convive com judeu. Ele tem tantos que não há como falar “você é isso”. É quase que para o meu Macu falar “você é branco”. Como assim? Ele nasceu no Capão Redondo, mora lá e vem falar que ele é branco? O meu Macu se acha negro e ninguém tira isso da cabeça dele. Ele vai provando ao longo do filme que é negro. Até uma hora que tem um embate, o filme pára e nós provamos para ele porque ele é branco. É a primeira vez que o Estado aparece no filme.


CPE por que a escolha do Capão Redondo para cenário da sua história?

JD – Eu escolhi o Capão Redondo, porque tinha vários amigos lá e sempre fui admirador dos Racionais MC’s, o Mano Brown mora lá. Convivo há 10 anos no Capão Redondo e tenho acompanhado todas as transformações do bairro. Quando chegou o momento de filmar, pensei lá. Cada pedacinho foi escolhido minuciosamente, mas os meninos, no meio do filme, saem do Capão Redondo e vêem São Paulo de uma maneira diferente. Embora seja no Capão, o filme transita. Todo mundo tem uma idéia sobre o Capão, só ouviram falar, sobre o número de chacinas ou alguém é seqüestrado e está lá. Toda vez o bairro é atrelado a uma história ruim. E eu fiz questão de filmar lá porque é uma história de amor, de amizade.


CP Em que momento da sua carreira de cineasta você se voltou para a temática do negro?

JD – Logo que cheguei na Escola de Comunicações e Artes (ECA) tive uma aula de roteiro e o professor pediu para que escrevêssemos uma história. Na minha tinha a palavra negro. E aí uma colega disse “por que na sua história tem negro?”. Eu pensei “caramba, as pessoas não se ligaram que eu sou negro, não sei se elas têm vergonha”, foi tão forte e a partir desse dia decidi escrever só sobre isso. Ao mesmo tempo, tem a questão de como funciona o mercado de cinema. Eu descobri uma frase polêmica, que ser negro no Brasil é um bom negócio, porque quando a gente fala em cultura urbana, basicamente nós falamos em juventude negra. É moda usar calça larga, boné pra trás e qualquer jovem, branco, de olho azul anda igual um maloqueiro negro do Bronx, do Harlen. Eles sabem quem são os Racionais MC’s, o MV Bill, assistiram “Tropa de Elite” e conhecem a música negra, inventada por negro favelado. A questão negra é muito positiva. Porque do ponto de vista do mercado é um bom negócio falar de negros.

CP E além do ponto de vista do mercado?

JD – Eu acho que uma coisa não exclui a outra. Eu penso que se o dinheiro fosse só meu, faria o filme que gostaria fazer, mas como eu sei que estou lidando com dinheiro público, há fatores que preciso cumprir, principalmente olhar para o público. Eu estou fazendo o filme que eu quero fazer e, ao mesmo tempo, não estou virado de costas para o mercado. No entanto, os cineastas estreantes fazem filmes geniais, mas de costas para o público. Temos que entender que não há como inventar outro público, que ama novela das oito, Big Brother e Faustão. Eu não tenho que me sujeitar a ele, mas tenho que levar em conta como funciona. Não dá para fazer um filme de arte e reclamar que o público não foi ver.


CP Dos seus curtas pra cá, você mudou em relação ao público?

JD – Não. Acho que os curtas que fiz só não tiveram muita visibilidade porque curtas não têm visibilidade. Quem assiste é basicamente o público universitário, mais restrito ainda do que o público do shopping. Pra mim, a grande contradição é que eu faço curtas sobre cultura negra, com atores negros e para jovens brancos assistirem.

CP Você pretende mostrar ao público no geral que existe outra realidade?

JD – Esse público grandão não existe. Minha mãe, por exemplo, jamais assistiria o Bróder! se eu não fosse filho dela. No Capão Redondo não tem sala de cinema. O público demarcado é branco, de 15 a 25 anos e vai ao shopping. Ele quer saber o que é o Capão Redondo. Eu quero me encontrar com esse público, o que eu tenho a dizer interessa a ele. Nesse sentido, estou fazendo a minha parte. Alguém vai ter que tentar em algum momento. Essa é minha ousadia, eu, negro, fazer um filme com o Caio Blat no Capão Redondo.

CP No Dogma Feijoada você diz que para a execução de um filme o protagonista deve ser negro. Houve a reformulação ou não desse Dogma, devido à escolha de Caio Blat para o papel?

JD – Tem um aprofundamento do Dogma Feijoada e acho que é um equívoco pautar quem é negro e quem não é pela questão da cor da pele. Isso é um erro, sem falar que o conceito de raça não existe, mas no mundo real há discriminação. Por que eu sou negro, a Camila Pitanga também e o Ronaldo, o fenômeno não? Esse conceito de tom de pele é delicado. O fato do Macu dizer que é negro, ninguém pode dizer que não. Pra mim, negro é aquele que se diz que é negro e é visto pela comunidade onde vive como uma pessoa negra.


CP – Qual é a sua opinião a respeito do movimento negro?

JD – Eu só não milito de ir a reuniões, mas vou a passeatas. Obviamente, tenho um senso crítico sobre o próprio movimento, mas prefiro não tomar partido. Sou um artista e gosto de ter atitudes irresponsáveis sobre o que eu faço. Por isso que eu chamei o Caio Blat para o filme. Talvez se eu fosse um militante negro jamais chamaria o Caio, mas sim o Lázaro Ramos.


CP Como você avalia a atuação da mídia na questão do negro?

JD–A mídia que comanda. Acho que têm poucos negros escrevendo, porque às vezes compramos muito a idéia de que estar nas frentes das câmeras basta. Não tenho dúvida alguma de que estar atrás das câmeras é muito mais importante do que na frente. Nós não precisamos de mais um Heraldo Pereira na apresentação do Jornal Nacional, mas sim de 30 “Ali Kamel” negros no comando. Isso faz a diferença.


CP Você está no comando agora?

JD – Não consegui ter 100% do meu filme, mas eu diria que estou no comando. Eu não faria outro filme de estréia. Uma das coisas que me deixa muito feliz é que eu sobrevivi. Mas já ouvi algumas obscenidades, como por exemplo: Daniel Filho impôs Caio Blat a você ou a Globo Filmes impôs todo o elenco global. Ninguém impôs nada.


CP Você acha que com atores globais consegue captar mais o público?

JD – Acho que sim. Inclusive a população do Capão Redondo vai achar muito bonita a história da comunidade com atores comprometidos, não acho que qualquer ator faria este filme. Eu, na realidade, queria contar com os melhores atores na arte cinematográfica. O Caio foi perfeito. Ele tinha a doçura que eu precisava e demonstrou uma escrotidão que o personagem precisava.


CPRecentemente a então ministra da Secretaria da Igualdade Racial, Matilde Ribeiro, pediu demissão, após denúncias de mau uso do cartão corporativo. Em que medida você acha que isso influencia na permanência ou exacerbação do preconceito?

O fato de uma mulher negra ter o status de ministra as pessoas pegarão mais pesado e estarão loucas para vê-la tropeçar nas próprias pernas. Eu não tenho dúvida nenhuma, por exemplo, de que estar fazendo um filme B.O. de luxo na companhia do Cacá Diegues, do Daniel Filho, da Globo Filmes e da Columbia Pictures causa várias coisas positivas, mas também muitos sentimentos baixos. Em Vários momentos as pessoas já me perguntaram: “mas qual é o esquema?” Quase me perguntando: “você deu pra quem ou comeu quem?” Isso é muito triste. Ninguém estava ao meu lado quando eu peguei o ônibus em Taubaté, e ninguém colocou os “xizinhos” na prova da Fuvest pra mim. Todas as vezes que o negro sai de um lugar onde as pessoas estão muito cômodas e vai para um outro, sempre há uma apreensão. A minha mãe sempre diz “Tome cuidado, não de alguém de te passar um rodo, mas de você tropeçar em suas próprias pernas”. Então no caso da ministra, acho que ela tropeçou, e, embora muita gente tenha utilizado o cartão corporativo, só ela está pagando. Na escala da sociedade brasileira está o macho adulto branco, morador do Rio e São Paulo, e lá embaixo, só acima do cachorro, do gato e do pernilongo, está a mulher negra. Isso é cruel. Sinceramente acho que o homem branco, a mulher branca, o gay branco e o homem negro podem ser ingênuos à vontade. Mas a mulher negra não pode dar moleza, pois ela é sempre a empregada doméstica, a faxineira, aquela que iniciou o menino sexualmente e que, durante anos de escravidão, foi a estuprada.


CP Atualmente você mora nos Jardins. Como você percebe a contradição existente entre os Jardins e o Capão Redondo? Lá você é branco ou negro?

JD – Há um ano mudei para a Oscar Freire, entre outras coisas, além de questões pessoais, porque eu entendo muito de preto, pobre, favelado, mas sempre senti muita curiosidade em ver como a elite se comporta, o que ela acha que a faz melhor do que todos os outros brasileiros. Acho engraçado, é um Brasil que eu não conhecia, além de freqüentar a questão racial de uma maneira absurda. Lá sou mais preto do que nunca. Eles se assustavam com o meu cabelo, com a minha cor. Às vezes, as pessoas abriam a porta do elevador e se assustavam de tal forma, que chegavam a pedir desculpas. São coisas comuns, de parar à porta de uma loja e os seguranças se aproximarem. Lá eu tenho mais medo do que em qualquer outro lugar, porque há uma coisa paramilitar, com seguranças rondando. O clima é de falsa calmaria, as pessoas andam em carros blindados. Enfim, em qualquer lugar onde há miséria muito grande, pode esperar que ela volta.

domingo, 9 de março de 2008

Era o Camisa Dez

Era o camisa dez da seleção
Tinha o olhar perdido
Talvez andasse perdido no mundo
Vestia a camisa e nada mais
pés descalços, cabelo encaracolado
Estava sozinho, tinha um olhar receoso
Todos o olhavam de maneira estranha
Tinha uns ouito anos
Era um brasileiro.

Sem voz

Pessoas morrem assassinadas
Crianças não têm o que comer
Crianças no semáforo vendem balas
outras assaltam
Outras morrem com fomem
Outras não nascem
Outras não vivem crianças
E todas não são ouvidas
Todas não têm casa
Todas não têm comida
E se todas assaltassem?
E se todas matassem?
Então seriam faladas
Seriam presas
Julgadas
Em silêncio
Julgadas por quem?
Julgadas pelo quê?
Julgadas por você
Mortas por você!